O Carácter Específico dos Processos Cognitivos
Definição e caracterização da perceção:
A perceção é um processo cognitivo através do qual
contactamos com o mundo, que se caracteriza por exigir a presença da realidade
a conhecer. Pela perceção, organizamos e interpretamos as informações
sensoriais. Por isso, a perceção começa nos órgãos recetores (sensoriais) que
são sensíveis a estímulos específicos.
A perceção é uma atividade cognitiva que não se limita ao
registo da informação sensorial, implica a atribuição de sentido, que remete
para a nossa experiência. As perceções resultam de um trabalho árduo de análise
e síntese por parte do cérebro, destacando o seu caráter ativo e influenciado
pelos conhecimentos, experiências, expectativas e interesses do sujeito, é uma
construção mental e uma interpretação da realidade.
Processo percetivo:
O nosso processo percetivo é construído por sistemas
sensoriais: visão, olfato, audição, tato, paladar e ainda pelo sentido do
equilíbrio e o sentido dos movimentos corporais. Estes sistemas sensoriais são
sensíveis a determinados tipos de estímulos.
Embora a receção sensorial seja diferente para os diferentes
órgãos dos sentidos, no processo percetivo existe 3 elementos:
1- Estimulo físico;
2- A sua tradução em
impulsos nervosos;
3- A resposta á
mensagem como perceção.
A perceção como representação:
As perceções não são cópias do mundo á nossa volta. A
perceção não reproduz o mundo como um espelho, o cérebro não regista o mundo
exterior como um fotógrafo tridimensional: constrói uma representação mental ou
imagem da realidade.
Na perceção visual, que é a grande fonte de informação sobre
o mundo, há todo um processo biológico complexo em que o estímulo visual é
transformado, não se projetando no nosso cérebro como um slide num ecrã. Os
estímulos luminosos, que sensibilizam a nossa retina, são codificados em
impulsos nervosos, que são transmitidos pelos nervos óticos às áreas visuais do
córtex, que os processam como uma representação.´
É no nosso cérebro que se vão estruturar e organizar as
representações do mundo, é no cérebro que se dá sentido ao que vemos e ouvimos.
Por isso se diz que é no cérebro que se ouve, se vê, se sente o frio, o calor,
os cheiros, os sabores. A informação proveniente dos órgãos sensoriais é
tratada pelo cérebro. É nesta estrutura do sistema nervoso que ganha sentido e
significado.
A interpretação da realidade: constância percetiva:
A visão que temos do mundo não é uma reprodução da realidade
mas uma interpretação – constância percetiva.
1- Constância de tamanho: percecionamos o tamanho de um objeto ou de uma pessoa independentemente da distância a que se encontra. Ora, o mesmo objeto, apresentado a diferentes distancias, forma na retina imagens com diferentes tamanhos: quanto mais longe está, mais pequeno aparece. É no cérebro que interpretamos os dados que recebemos.
2- Constância da
forma: um objeto nunca forma a mesma imagem retiniana: a luz é diferente, a
incidência e o angulo do olhar diferentes também, a distância muda
constantemente. O reconhecimento envolve sistemas elaborados em que intervêm a
experiencia anterior do sujeito, as memorias armazenadas, as aprendizagens do
sujeito. Por exemplo, nós percecionamos a porta como retangular, mas quando a
abrimos ela perde essa forma.
3- Constância do
brilho e da cor: mantemos constantes o brilho e a cor dos objetos, mesmo quando
as circunstâncias físicas nos dão outra informação. Percecionamos uma casa
branca em plena luz do sol e mantemos constante a cor, á noite, percecionamos o
sangue sempre vermelho, a neve sempre branca, independentemente da quantidade
de luz.
Reconhecer o caráter subjetivo da perceção:
A nossa perceção do mundo é subjetiva, na medida em que
percebemos o meio que nos rodeia em função dos nossos conhecimentos adquiridos,
necessidades, interesses, valores, expectativas e experiências passadas. É
importante perceber que não percecionamos de uma forma neutra e objetiva, mas
antes individual, parcial e subjetiva. E é devido a esta última característica
que a perceção nos permite antecipar acontecimentos e prever comportamentos, o
que nos permite prepararmo-nos para eles.
Por outro lado, a motivação e os estados emocionais de cada
um têm grande influência na perceção que o indivíduo tem da realidade numa dada
situação, por exemplo, o nervosismo e o medo implicam, regularmente, uma distorção
e ampliação de factos que nos é incontrolável.
Também o interesse que os acontecimentos e assuntos nos
despertam é importante para a perceção já que os estímulos percetivos são
selecionados pela nossa atenção e, por isso, tendemos a adquirir mais conhecimentos
nas áreas que mais nos fascinam.
Por fim, a subjetividade nota-se nas expectativas. Estas
afetam as nossas perceções levando-nos, frequentemente, à ilusão e consequente
desilusão.
Conceito de perceção social:
Perceção social é o processo que está na base das interações
sociais, ou seja, o modo como conhecemos os outros, analisamos os seus
comportamentos e entendemos os seus perfis. É o modo como percecionamos as
situações sociais e o comportamento dos outros que orienta o nosso próprio comportamento.
Por isso, podemos afirmar que a perceção social está inteiramente relacionada
com os grupos sociais, a cultura e o contexto social do indivíduo.
A predisposição percetiva mostra-nos que os indivíduos e os
grupos sociais atribuem significados particulares à realidade física,
reconstruindo-a e, muitas vezes, percebendo situações de modo diferente. Um
exemplo disso, é o efeito dos estereótipos e dos preconceitos na perceção.
Conceito de perceção e cultura:
A forma como percecionamos o mundo varia com a cultura, com
o contexto cultural. Reconhecemos que o modo como um chines, um europeu, um
americano ou um indiano representam o mundo, é diferente.
A perceção de profundidade é também afetada pela cultura. A
diferença de tamanhos entre objetos é interpretada como estando a distâncias
diferentes: por exemplo um lápis estando mais longe, parece mais pequeno.
Definição de memória:
A memória pode ser entendida como o registo de todas as
experiências existentes na consciência, bem como a qualidade, extensão e
precisão dessas lembranças. A memória é a capacidade do cérebro em armazenar,
reter e recordar a informação.
A memória está na base de todas as funções psíquicas: da
perceção, da aprendizagem, da imaginação, do raciocínio, etc.
Não podemos conceber a vida humana sem memória. É a partir
das informações que o indivíduo possui que se adapta ao meio e atribui
significado às experiências vividas. Sem ela, seria impossível a transmissão e
desenvolvimento cultural. O homem seria um ser puramente biológico.
É a memória que nos dá o sentimento de identidade pessoal:
as experiências vividas, acumuladas e que nos reconhecemos como nossas
constituem o nosso património pessoal que nos distingue dos outros e nos torna
únicos. Sem memória não existe identidade.
A memória humana é limitada na sua capacidade de
armazenamento e afetada pelos sentimentos, emoções, experiências, imaginação e,
ainda, pelo tempo.
Processos de memória.
Se a memória é a capacidade do cérebro em armazenar, reter e
recordar a informação, então são estes os três processos base de memória.
A codificação é a primeira operação da memória. Prepara as
informações sensoriais para serem armazenadas no cérebro. Traduz os dados
recebidos em códigos visuais, acústicos ou semânticos. Quando queremos
memorizar algo, agimos em função de uma aprendizagem deliberada que nos exige
mais atenção e, como tal, uma codificação mais profunda.
Depois de codificada, a informação deve ser armazenada, o
que acontece por um período variável. Cada elemento de uma memória é guardado
em várias áreas cerebrais. Engramas são traços mnésicos resultantes das
modificações no cérebro que ocorrem para o armazenamento. Cada engrama produz
modificações nas redes neuronais que permitem a recordação do que se memorizou
sempre que necessário. O processo de fixação é complexo e a informação que se
armazena está sempre sujeito a modificações, o que implica que, para que ela se
mantenha estável e permanente, seja necessário tempo.
A recuperação é, como o nome indica, a fase em que
recuperamos, recordamos, reproduzimos a informação anteriormente guardada.
Caracterização a memória de curto prazo:
A memória a curto prazo está presente no hipocampo. É uma
memória que retém a informação durante um tempo curto limitado, a partir do
qual pode ser esquecida ou promovida para a memória a longo prazo.
Distinguem-se a memória imediata e a memória de trabalho:
A memória imediata (sensorial) é aquela que retém a
informação apenas por uma fração de tempo (~30segundos). Normalmente,
conseguimos reter de 5 a 9 unidades de informação: 5-9 dígitos, 5-9 letras.
A memória de trabalho acontece quando mantemos a informação
enquanto ela nos é útil, por exemplo quando repetimos um nome ou um número
várias vezes porque não o pudemos escrever.
Ambas se completam e formam a memória a curto prazo.
Qualquer informação que tenha estado na memória a curto prazo e que se tenha
perdido é irrecuperável.
Conhecer os diferentes tipos de memória de longo prazo.
A memória a longo prazo retém os materiais durante horas, meses ou toda a vida.
Há dois tipos de memória de longo prazo: a memória não
declarativa e a declarativa.
- A memória não declarativa é automática, retém as
informações do género “como fazer?”. É o exercício, a repetição do conjunto de
práticas que tornam a atividade automática. Só conseguimos atingir este tipo de
memória através da ação. Explicar como andar de bicicleta é muito complicado, a
tendência é sempre exemplificar. Para isso, não é preciso localização temporal,
reflexão ou reconhecimento a não ser que nos seja perguntada alguma referência.
Memória não declarativa é também chamada memória implícita ou sem registo.
- A memória declarativa, explícita ou com registo, implica
consciência do passado, do tempo, de experiências vividas, de acontecimentos e
pessoas. Esta memória lida com conteúdos que podem ser declarados, ou seja,
transpostos para palavras. Dentro desta memória, podemos ainda separar a
memória episódica da semântica.
- A memória episódica é constantemente associada a memória
autobiográfica exatamente porque se reporta a lembranças da vida pessoal.
Envolve rostos de pessoas, músicas, factos, experiências. É pessoal e manifesta
uma relação íntima entre quem recorda e o que se recorda.
- A memória semântica permite identificar objetos e conhecer
o significado das palavras. Refere-se ao conhecimento geral sobre o mundo:
leis, factos, fórmulas, regras. Não há localização no tempo, não há ligação com
qualquer ação ou conhecimento específico. Sabe-se que 3² = 9 e esse conhecimento
é retido assim, simplesmente. Se se associar quem ensinou, por exemplo, o
professor de matemática, já nos estarmos a reportar à memória episódica.
Compreender a memória como processo ativo e dinâmico.
A memória é um processo ativo e dinâmico na medida em que
não reproduz fielmente aquilo que armazenou. A memória reconstrói os dados, o
que implica que dê mais relevo a uns, distorça outros ou mesmo os omita. Por
outro lado, quando os acontecimentos são muito emotivos, a memória deixa
escapar pormenores que depois são substituídos/reconstruídos pelo cérebro. Quem
conta um conto, acrescenta um ponto e, assim, quanto mais se reproduz o que
aconteceu, mais elaborada e complexa vai ficando a história, chegando a um
ponto em que muitos factos não passam de imaginação.
No entanto, as representações que temos são sempre tão
claras como se fossem plenas reproduções da realidade, o que faz com que este
processo ativo e dinâmico nos passe completamente despercebido. Por este
motivo, o mesmo acontecimento pode ser descrito de formas bastante diferentes
por diferentes pessoas. Não mentem, apenas têm diferentes interpretações
resultantes de diferentes sentimentos, emoções e atenção.
Relacionar memória e esquecimento.
A memória é seletiva e limitada na sua capacidade de armazenamento.
Por isso, o esquecimento é condição essencial ao normal funcionamento da
memória.
Podemos definir esquecimento como a incapacidade de
recordar, de recuperar dados, informações, experiências que foram memorizadas
no passado. O esquecimento pode ser provisório ou definitivo. Apesar de estar
carregado de uma imagem negativa, o esquecimento é essencial. Só continuamos,
ao longo de toda a vida, a memorizar informação porque conseguimos esquecer
outra. O esquecimento tem uma função seletiva e adaptativa, já que despreza a
informação inútil e desnecessária e os conteúdos conflituosos, impedindo um
excesso de informação acumulado no cérebro que bloquearia a captação de novos
assuntos.
O esquecimento está, normalmente, mais relacionado com a
memória a longo prazo uma vez que, na memória a curto prazo, o tempo de
retenção da informação é demasiado curto: esta ou passa para a memória a longo
prazo ou é apagada.
Explicar diferentes tipos de esquecimento: motivado, interferência das aprendizagens e regressivo.
O esquecimento regressivo acontece quando há dificuldades em
apreender novas informações e relembrar conhecimentos, factos, nomes e números
recentes. É frequente ocorrer, maioritariamente, em pessoas mais idosas devido
à degenerescência dos tecidos cerebrais. Apesar disso, o envelhecimento pode
ser retardado com uma vida ativa, empenhada e equilibrada.
O esquecimento motivado aparece na sequência da teoria do
psiquismo humano de Freud. Assim, esquecemos o que, inconscientemente, nos
convém esquecer. De forma a assegurar o equilíbrio psicológico, o cérebro tende
a esquecer todos os conteúdos que possam ser traumatizantes, dolorosos
angustiantes, fenómeno a que chamamos recalcamento. Através deste mecanismo de
defesa, os conteúdos do inconsciente são impedidos de atingir a consciência,
diminuindo a incidência de momentos tensos provocados por conflitos internos.
O esquecimento por interferência das aprendizagens
explica-se pela interação das novas memórias com as mais antigas. As memórias
mais antigas não desaparecem, mas sofrem alterações por efeito da transferência
de aprendizagens e experiências posteriores que as tornam irreconhecíveis.
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